sexta-feira, 17 de julho de 2009

Nova lei promete facilitar adoção de milhares de crianças no país

A nova Lei Nacional da Adoção, aprovada pelo Senado na última quarta-feira, pretende garantir o direito de 80 mil meninos e meninas que hoje vivem em abrigos no país à convivência com uma família. O projeto de lei segue agora para sanção presidencial. A legislação vem resolver um problema de grandes proporções do país. A maior parte das crianças e dos adolescentes abrigados fica numa espécie de limbo jurídico: nem pode voltar para sua família, nem pode ser adotada. E essa situação dura por tempo indeterminado. O resultado é visível nos números. O Cadastro Nacional de Adoção (CNA) completou um ano com cerca de 20 mil pais cadastrados e apenas pouco mais de 2 mil crianças.
Além de dispor sobre as regras da adoção, a nova legislação cria dispositivos para evitar que os abrigos se tornem um fim para crianças que têm seus direitos violados. A partir de agora, quando um juiz encaminhar um menino ou menina para uma instituição, deve acompanhar sua situação a cada seis meses. Se antes o magistrado precisava justificar a medida somente no ato do abrigamento, agora o fará semestralmente. No fim de dois anos ou a família perde o poder familiar ou a criança retorna para casa.
No primeiro caso, a adoção não é a única saída. Há ainda a possibilidade de acolhimento familiar, quando a criança é cuidada por pais e mães sociais, e a família extensa, quando ela fica com tios, avós ou alguém com quem tenha vínculo afetivo, além da permanência nos abrigos em casos excepcionais.
Na hora da adoção, as crianças maiores de 12 anos vão poder opinar se desejam ou não viver em outra família. A preferência é para que os irmãos permaneçam juntos e sejam adotados por brasileiros. Quando completar 18 anos, o adotado pode ter acesso a sua origem biológica por meio do processo judicial. A previsão de punição para a adoção ilegal, realizada sem a participação do Judiciário, foi retirada do projeto. O texto original criminalizava a prática. Para tentar resolver a preferência de adoção por crianças menores e brancas, a legislação prevê que o poder público realize campanhas de conscientização.
Laços preservados
O vice-presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Francisco Oliveira Neto, não vê dificuldades para implantação da lei. “É uma nova concepção, uma nova prática. Falta de recursos não será a justificativa para não implementá-la.” Sobre a exclusão da punição a quem adota de forma ilegal, ele concorda e argumenta que a lei não pode fechar os olhos para esta prática. “Não é um incentivo para que isso ocorra, mas não podemos tirar uma criança do lado de quem ela tem um laço afetivo forte”.
O promotor Murillo Digiácomo, do Centro de Apoio Operacional às Promotorias (Caop) de Infância e Juventude do Ministério Público do Paraná, afirma que o Judiciário não pode fazer tudo sozinho e por isso a legislação prevê que sejam criadas políticas públicas para evitar que as crianças permaneçam longos períodos nas instituições. O Estado deve primeiro evitar que os meninos e meninas sejam encaminhados aos abrigos. Para isso, deve criar ações de promoção às famílias. Em último caso, o abrigamento ocorre e por pouco tempo.
Para o promotor carioca Sávio Bittencourt, ex-presidente da Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção (Angaad) a legislação permite que se quebre um estigma sobre a adoção e sobre quem está interessado em adotar. “O Estado praticamente jogava as crianças nas instituições, deixava-as lá por anos e um dia dizia que não poderia destituir o poder familiar porque não havia ninguém interessado em adoção. É muito fácil dizer que o adotante é cheio de preconceitos e que só quer bebês brancos quando o próprio Estado não faz nada”, critica.
Quem ficou feliz com a aprovação da nova lei foram os irmãos Maria, 7 anos, Fernando, 9, Gabriela, 10 e Luis, 11. Eles moram na Associação Cristã de Assistência Social (Acridas), uma organização não governamental que cuida de 90 crianças em situação de vulnerabilidade social. Eles estão há três anos no local e demoraram muito tempo para entender que a mãe, usuária de drogas, tinha ido embora e não voltaria mais. Regina Natália Souza Mendes, coordenadora do local, comemora a nova lei, mas acredita que ainda há um longo caminho pela frente para mudar histórias como a dos quatro irmãos. “As pessoas precisam se conscientizar que adotar é um ato de amor e não uma supressão de carências afetivas. Quando isso ocorre, não há distinção de cor e idade.”
(Gazeta do Povo)

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